A dona de casa Valdete Ferreira da Silva, de 68 anos, luta há 12 para trazer de volta para Rio Preto nove familiares. Todos eles entraram para a seita "Jesus, A Verdade Que Marca", grupo que teve 13 pessoas presas nessa semana após operação da Polícia Federal e do Ministério do Trabalho. Eles são acusados de escravizar os fiéis em fazendas de Minas Gerais, além de tráfico de pessoas, lavagem de dinheiro e estelionato. Entre os líderes presos, está o empresário de Olímpia José Donizeti Buzzato, que foi enviado para Presídio Nelson Hungria, em Belo Horizonte.
"Perdi quase toda minha família para esta seita. Minhas duas filhas, dois genros e cinco netos. Agora que prenderam os líderes, vamos ver se todos voltam para casa. Quero minha família de volta", diz a dona de casa.
Nos últimos anos, a vida da aposentada é tentar convencer os parentes a abandonar a seita e denunciar em redes sociais os líderes da igreja pela exploração dos parentes. "Eu cobrei da polícia para que eles tomassem uma providência, porque o pessoal da igreja trocava constantemente de fazenda meus parentes. Eles trabalham sem ganhar um centavo." Hoje, ela não sabe em que cidade os parentes estão.
Segundo Valdete, as filhas trabalham na horta, vendem as verduras e todo dinheiro é repassado para os coordenadores das fazendas. Quando precisam de alimentos, roupas, medicamentos, entre outros objetos pessoais, como celular, elas devem pedir para um dos líderes da igreja. "Uma das minhas filhas esteve aqui há três meses para me visitar. Falei para ela ficar, mas ela não quer abandonar a seita. Tenho esperança que esta operação consiga trazer meu povo de volta para casa."
A dona de casa chegou até a ficar alegre com a deflagração da Operação Canaã - A Colheita Final, mas voltou a ser preocupar quando uma de suas filhas, por meio de mensagem do WhatsApp, disse que não acredita que foram encontradas irregularidades nas fazendas e avisou que não tem intenção de voltar.
Uma das filhas mandou mensagem para a mãe, dizendo que não acredita nas acusações. "Espero que a Justiça puna todos os envolvidos e façam devolver para minha filha a casa e os R$ 70 mil que pegaram dela, para que quando sair da seita tenha como recomeçar sua vida. Porque hoje eles não têm nada", diz a mulher.
Investigação - Segundo a denúncia, os fiéis eram forçados a trabalhar em lavouras e estabelecimentos comerciais, como oficinas mecânicas, postos de gasolina, pastelarias e confecções, sem descanso e remuneração. O coordenador da operação, Marcelo Campos, do Ministério do Trabalho, afirma que foram encontradas 600 pessoas em trabalho escravo nas fazendas da seita. "Os líderes foram enquadrados pelos crimes de tráfico de pessoas e submissão ao trabalho escravo. Eles vão ser processados em ação penal e pelo MT."
A seita é acusada de atuar em municípios de São Paulo, Bahia e Minas Gerais, para convocar fiéis para as fazendas, com a promessa de recompensa divina. Os agentes da PF, acompanhados de fiscais do MT, cumpriram 22 mandados de prisão preventiva, 17 de interdição de estabelecimento comercial e 42 de busca e apreensão - todos expedidos pela 4ª Vara Federal em Belo Horizonte.
Para Marcelo, o maior desafio após a operação é convencer as pessoas que fazem parte da seita que eles foram explorados financeiramente. "Como estas pessoas estão muito convencidas religiosamente sobre o trabalho, e doutrinadas, elas acham que estão numa situação quase de paraíso, e não querem sair. Diferente de outras pessoas encontradas em trabalho escravo. Essas não querem sair da igreja e nem das fazendas", revela o coordenador.
Fonte: Diário da Região