Sexta, 29 Setembro 2017

Desafio do combate ao tráfico de pessoas é tornar lei conhecida

Como fazer a nova lei do tráfico de pessoas, a 13.344/2016, que completa um ano no próximo mês, “pegar”? O questionamento é do palestrante inicial do 1º Seminário de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Mato Grosso (OAB-MT), o juiz de direito do estado de Goiás, Rinaldo Aparecido Barros.


Ativista da causa há mais de 10 anos, o magistrado compareceu ao evento, na manhã desta quinta-feira (28), no auditório da OAB-MT, para despertar no público, formado em sua maioria por homens das forças policiais de Mato Grosso, a real situação do tráfico de pessoas no país e no mundo, que não é revelada à sociedade.


“Essa lei vai ‘pegar’? Depende de nós torná-la conhecida, depende de dar voz às vítimas, de mostrar que o tráfico de pessoas é uma realidade alarmante no Brasil e no mundo. Temos o exemplo da Lei Maria da Penha que é conhecida por 98% da população exatamente porque surgiu da demanda das vítimas. A lei de tráfico de pessoas é o contrário, é uma determinação que o Brasil assumiu perante as Nações Unidas. É muito importante que a população passe a conhecer essa lei, que as potenciais vítimas tenham condições de se prevenir para que não caiam nas redes de aliciamento”, ponderou o magistrado durante sua fala.


O tráfico de pessoas, com a nova legislação, passou a ser considerado um atentado individual contra a liberdade do cidadão. Assim, vinculou-se a ela todo o tipo de exploração: sexual, de trabalho análogo ao de escravidão, para retirada de órgãos, adoção ilegal, dentre outros fins criminosos. Porém, um questionamento a seu respeito é a pena prevista para quem comete o crime, inferior àquela sentenciada a quem pratica tráfico de drogas.
Para o condenado por tráfico de pessoas a pena varia de 4 a 8 anos de reclusão – o que redunda, pelo ordenamento brasileiro, em prisão no regime semiaberto. Quanto ao tráfico de drogas, a penalidade é de 5 a 15 anos, o que culmina na prisão do sentenciado.


“É difícil entender por que o tráfico de pessoas não incomoda tanto quanto o tráfico de drogas. Os juízes precisam sentir a situação. Em 2016, foram 29 milhões de mulheres e meninas vítimas de escravidão moderna, 70% do total de 40 milhões. Como isso não choca? Casamentos forçados, com casos de meninas com 9 anos. Trabalho infantil, 152 milhões no mundo, 73 mi no trabalho perigoso. Nós lutamos, lá no Conselho Nacional de Justiça, para que essa nova lei tivesse uma pena maior. Não posso conceber que a pena de tráfico de pessoas seja inferior à pena de tráfico de drogas”, argumentou.


Por fim, o juiz, que mantém, por iniciativa própria o site www.traficodepessoas.org para divulgar casos, medidas de prevenção e ajudar vítimas e famílias na solução de casos, deu um alerta para não ser fisgado por uma rede de aliciamento.


“Estamos lutando contra um inimigo invisível. Temos que conhecer o problema. A melhor forma de prevenir é o conhecimento. E o pensamento. Ninguém vai te fazer uma proposta incrível de trabalho do nada. Desconfie sempre e procure saber mais informações junto aos órgãos e não faça nada sem pensar, sem tomar os cuidados devidos. Atenção também com as redes sociais, que se transformaram num mecanismo de aliciamento de vítimas no mundo. Todo cuidado é pouco e ninguém vai dar nada de graça pra ninguém. Procure informação”, reforçou.


O ex-procurador-geral de Mato Grosso, Paulo Prado, foi o debatedor do painel, juntamente com a presidente da Comissão de Infância e Juventude da OAB-MT, realizadora do evento, Tatiane Barros.


Abertura – O seminário foi elaborado para capacitar membros das polícias que atuam em Mato Grosso: Militar, Civil, Federal, Rodoviária Federal, além dos grupos especiais, como Especial de Fronteira e o Centro Integrado de Operações Aéreas. Assim como demais integrantes das redes de combate, como do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos Conselhos Tutelares, dentre outros.


“O objetivo é debater o tema, capacitar e integrar as forças e as redes de enfrentamento o tráfico de pessoas, que pode ser considerado um dos maiores problemas da sociedade atual. É de grande relevância no Brasil devido à incidência no país e, ainda, entre brasileiros que vivem no exterior. Por esse motivo, são necessárias atualizações, capacitações e cursos para que se tenha um olhar diferenciado para o tráfico de pessoas, para definitivamente entender e tipificar o tráfico de pessoas”, destacou a anfitriã do encontro, Tatiane Barros.


O desembargador Rui Ramos, presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, enfatizou o momento único que o país passa na atualidade, invocando a necessidade de que pessoas de conduta positivamente determinante assumam as instituições brasileiras. “Estamos saindo do estágio da anestesia para uma grande assepsia. Temos que dar um basta aos nefastos. Para isso, é necessário deixar o menor esforço, que não resolve problema algum, para agirmos com determinação. Por isso a importância de participar desse seminário, de aprender, de melhorar”.


Representando a diretoria da OAB-MT, a secretária-geral adjunta Gisela Cardoso disse que a mobilização dos presentes no encontro demonstrava a crença que há esperança pela retomada dos interesses coletivos. “É hora de buscar a reconstrução da justiça. A OAB, legítima representante da sociedade, tem todo o respeito pelos poderes constituídos e pelas instituições e acredita que o interesse comum social vai prevalecer”.


Ainda participaram da solenidade de abertura diversas autoridades representantes das polícias Civil, Militar, Rodoviária Federal, Federal, do Conselho Estadual do Direito da Criança, a Associação Mato-grossense de Apoio e Pesquisa à Adoção (Ampara), do Comitê de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e das secretarias de Segurança Pública e Emprego, Trabalho e Assistência Social do Estado.
A programação do Seminário segue até a tarde desta sexta-feira.

Fonte: FolhaMax 

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