É incompreensivo, ilógico, imoral e criminoso que praticamente mais de noventa por cento dos países-membros das Nações Unidas não consigam implantar umcadastro nacional atualizadoque permita que as agências policiais do mundo busquem e obtenham um índice satisfatório de resgate.
É inadmissível que não exista umacarteira nacional de identidade, apenas regionais, quando o cadastro de pessoa física (CPF) com fotos poderia preencher essa necessidade; é intolerável que oboletim de ocorrência não seja cadastrado diretamente pela autoridade policial ao cadastronacional, transferindo essa responsabilidade aos pais; é frustrante que não exista um programa permanente em forma de campanha para orientar o cidadão a evitar um desaparecimento ou a como proceder se isso ocorrer. Pior ainda é não existir atendimento psicológico e social em nenhuma fase dessa mazela, além de não existir um protocolo com passo a passo para ser executado pelo poder público.
Quando falamos de crianças e adolescentes desaparecidos, estamos falando também de abusos sexuais, violência contra a mulher, racismo e trabalho escravo. Estamos falando de um crime que tem retorno econômico de quase 100 bilhões de dólares anuais, se expandindo entre 10% e 20% ao ano.
Um total absurdo é não haver um Observatório Internacional de Crianças e Adolescentes desaparecidos para onde fosse possível convergir os trabalhos acadêmicos, os trabalhos realizados por ONGs, os exemplos dados por cerca de duas dezenas de países que conseguem, através de protocolos, melhores resultados. Urge a necessidade de um protocolo ou resolução das Nações Unidas.
De repente, você pode não ter filho ou neto ou mesmo não gostar de criança, mas você não conseguirá ser feliz ao imaginar um menor de idade desaparecendo para transplantes de órgãos ou trabalhos forçados (inclusive militares) ou saciando sexualmente a bestialidade humana e sofrendo a dor recíproca, visceral e angustiante de famílias que convivem com a morte em vida e a vida em morte.
A omissão é uma forma de cumplicidade.
Ricardo Paiva é integrante da Comissão de Ações Sociais do Conselho Federal de Medicina e da ONG Movimento Humanos Direitos (MHuD).