Jovens aliciados por traficantes e até mesmo adolescentes apaixonados criam historias fantasiosas para despistar a verdade. Raramente concretizam seu intento, principalmente quando a Polícia Civil é acionada e começa uma árdua caça em busca da realidade.
Rondônia Dinâmica acompanhou uma diligência realizada por agentes da Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (DEPCA), cuja titularidade pertence a delegada Lucilene Novais. A incursão, no entanto, foi encabeçada pelo chefe do SEVIC (Serviço de Investigação e Captura) Flávio Rodrigues Lima, que atua na função desde 2009.
“O caso que vamos ver agora é a quarta ou quinta vez que vamos averiguar. A menina sempre foge. Eu acho que ela foi aliciada, se entrosou com pessoal envolvido com droga, aí acabou pegando embalo, se acostumando”, disse Lima.
Diva Correia da Silva, dona de casa no Bairro Teixeirão, é mãe da adolescente G., de apenas 13 anos. E é G. que vem desencadeado o trabalho reiterado da polícia por conta de seus desaparecimentos repentinos. Como o próprio agente destacou, a hipótese que melhor se encaixa na ocorrência é que a jovem tenha sido aliciada por criminosos.
“O motivo [das fugas] é porque não aceitamos que ela traga os moleques pra cá. A gente sabe que usam drogas, né? Não aceitávamos que eles usassem drogas aqui. Queria ficar até quatro horas da manhã na rua. Por isso ela não aceitou e foi embora. Eu perguntei se era usuária de drogas e ela me respondeu que consome maconha. Ela já foi capturada outras vezes, mas não estava aqui. Só o pai”, disse a genitora.
Em seguida, apontou:
“O pai dela sabe [da situação]. Ele foi embora, mas sabia como estava a menina. Ela ficou assim porque gostava muito do pai e viu ele usando drogas na frente dela. Eu acho que isso contribuiu. Eu gostaria que ela ficasse, mas é a quinta vez que ela foge. Aí vem pra casa, quando pensamos que está tudo bem ela vai embora, foge de novo. Já procurei acompanhamento psicológico, ela foi, mas não deu certo. Ficou do mesmo jeito”, alegou.
E concluiu:
“Pensei em internar minha filha. Deram mais uma chance para ela. Eu disse que não adiantaria. São cinco chances e nada. Tudo que eu quero é que, caso a peguem, a internem. Não adianta ela voltar pra casa. Quero que ela seja internada. Anda só com gente que não presta, fazendo coisa errada. Aí é difícil”, finalizou.
Após ouvir o desabafo de dona Diva, a redação continuou o percurso em busca da menina G., desembocando num grande condomínio situado à Zona Leste da Capital, no Bairro Jardim Santana. Lá, nova frustração. Nada da adolescente e muito menos seus supostos aliciadores.
Para surpresa da reportagem, uma moradora compadeceu-se da situação de Diva e confidenciou passar pelo mesmo, inclusive tentando afagar a dona de casa com conselhos e indicações. Maria da Conceição Costa, mãe da adolescente R. de 14 anos, que trabalha numa loja de equipamentos eletrônicos, disse:
“Elas [as crianças] montam uma história, tentam enganar até a polícia. A minha falou para a polícia que foi levada da porta de casa, que um cara veio no carro, a colocou no veículo e a levou. Sou o tipo de mãe que fuça tudo. Conhecidas dela entravam em contato descrevendo inclusive características do homem que a teria levado. Ficou dois dias e meio desaparecida e foi encontrada no Bairro Mariana. Ela me ligou e pediu que eu a buscasse, insistindo na farsa do rapto. Quando cheguei, ela estava sentada numa praça, toda suja. Investiguei até descobrir que ela se encontrava com um rapaz desde os 12 anos”, relatou.
Histórias assim ‘pipocam’ na DEPCA, são as chamadas fugas do lar, situações não tratadas especificamente como desaparecimento em si, com protocolos de investigação diferenciados. Esses casos envolvem revolta infantojuvenil, briga com parentes, necessidade de aclamar uma falsa independência e acabam desencadeando toda a mobilização dos agentes varias vezes ao ano. Flávio Rodrigues disse que, do total de ocorrências que aportam à delegacia, dez a quinze casos referem-se à fuga do lar. Seriam, aproximadamente, 180 registros por ano, ocupando a maior parte do tempo dos funcionários públicos, prejudicando a investigação de casos sérios e complicados a exemplo dos relatados abaixo.
Porto Velho: os dois casos de desaparecimento sem solução
Taís Tauane, 11 anos
Ainda de acordo com o chefe do SEVIC, um caso concreto de desaparecimento está sem solução até hoje. Trata-se do sumiço da menina Taís Tauane, de 11 anos, desaparecida em 2008. Taís teria ido à aula, como fazia regularmente. Seguiu seu caminho de bicicleta para a escola, na Rua José Amador dos Reis e nunca mais foi vista.
“Há um vácuo nessa história. Colhemos todas as informações possíveis, mas não se sabe ao final se a menina teria saído no intervalo ou ao final da aula. A bicicleta nunca apareceu. Alguns moradores da região dizem que ela teria sido vista em local específico. Realizamos diligência, mas não havia maiores informações. O fato é que nunca mais apareceu”, lamentou Rodrigues.
Caso bebê Nicolas: desaparecimento ou homicídio?
O caso do bebê Nicolas Naitz Silva , que paralisou o Estado de Rondônia em maio de 2014 tamanha repercussão, também está entre as estatísticas negativas conferidas a DEPCA. Isso porque, segundo Flávio Rodrigues, a situação do menino foi encaminhada à Delegacia de Homicídios, mas acabou retornando à DEPCA por conta do episódio do motoboy cuja identidade continua um mistério até hoje.
“Um inquérito foi aberto e delegado o finalizou. Só que o promotor responsável pelo caso não aceitou a conclusão. O promotor não aceitou em virtude do vídeo do motoboy. Chovia naquele dia, o cidadão estava de capa de chuva e entrou de capacete no prédio do hospital. Subiu à UTI e, quando a médica responsável chegou, ele foi embora, apressando o passo. Até hoje não foi identificado. Todas as pizzarias e lanchonetes que entregavam no hospital foram investigadas . Ele não existe. Para nós ele é fictício. Como a investigação não está concluída, o caso foi dado como desaparecimento”, encerrou Lima.
Fonte : RONDONIADINAMICA.COM